“APTO COM RESTRIÇÃO” É UM SERVIÇO OU DESSERVIÇO?
A emissão de ASO “Apto com Restrição” é uma prática em muitas empresas e dependendo de sua atividade, do setor, do colaborador e até mesmo da cultura da empresa, pode ser uma opção, porém, em outras empresas (posso citar as Indústrias, o Agro entre outras) esta ação tem um impacto muito negativo para todos.
A dificuldade de uma área operacional, entenda aqui a operação e manutenção, em criar um espaço, uma atividade ou mesmo um posto de trabalho para adequar a reintegração de colaborador “Apto com Restrição”, acaba por gerar um desgaste entre eles, a área médica e a Segurança do Trabalho.
A discussão sobre o cuidado com o colaborador e a responsabilidade da empresa para reintegração são genuínas, mas necessitam de um estudo abrangente pois a voz do médico do trabalho não pode ser majoritária, posto que há um alto risco à saúde do colaborador, a responsabilização criminal do líder imediato e um passivo trabalhista.
O tema é polêmico e não chegaremos um consenso, mas meu objetivo de trazer este tema é que você avalie se esta é realmente uma boa ou má prática para o negócio de sua empresa.
O QUE SIGNIFICA ASO "APTO COM RESTRIÇÃO"?
A expressão “Apto com Restrição” em um Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) indica que o trabalhador está apto para exercer a função, mas com algumas limitações ou condições específicas. Isso significa que o médico do trabalho identificou algum problema de saúde ou condição que exige cuidados especiais ou restrições no desempenho da função.
O que pode causar uma restrição?
- Doenças Preexistentes: condições de saúde que o trabalhador já possuía antes de ingressar na empresa. Exemplo: uma perda auditiva.
- Doenças Ocupacionais: doenças causadas ou agravadas pelo trabalho. Exemplo: uma sequela de uma DORT.
- Acidentes de Trabalho: lesões ou sequelas de acidentes ocorridos no trabalho. Exemplo: perda parcial de algum movimento.
- Condições Temporárias: problemas de saúde temporários, como gravidez ou recuperação de cirurgias. Exemplo: cirurgia de hernia inguinal, que impossibilita o trabalhador de levantar peso.
Exemplos de Restrições Comuns: Limitação de Carga, Restrição de Movimentos, Uso de Equipamentos de Proteção, Restrição de Horário, Adaptação do Posto de Trabalho etc.
ASO “APTO COM RESTRIÇÃO”: LEGAL OU ILEGAL?
O que a Lei diz
Segundo a Norma Regulamentadora 7, há duas opções para o médico do trabalho constar no Atestado de Saúde Ocupacional ASO apto ou inapto. O ASO deverá conter no mínimo esta definição para a função específica que o trabalhador vai exercer, exerce ou exerceu.
A legislação trabalhista brasileira (Consolidação das Leis do Trabalho – CLT) e as Normas Regulamentadoras (NRs) não proíbem e nem permitem explicitamente o “Apto com Restrição””. O que a lei exige é que a empresa garanta um ambiente de trabalho seguro e saudável para todos os trabalhadores (Artigo 157 da CLT).
O Manual de Homologação do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) no CAPÍTULO III – Procedimentos da Assistência Pública 2ªedição de 2007, que está atualmente disponível no site do (MTE), traz no item 2, Causas Obstativas da Rescisão Pag. 26, 2.1 Impedimentos Absolutos para o Ato Homologatório a seguinte redação:
c) Inaptidão Atestada no ASO O Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) emitido para fins demissionais, que concluir pela inaptidão do trabalhador, constitui impedimento absoluto para o ato homologatório.
Configurando-se a hipótese, o assistente deve orientar a empresa para que encaminhe o trabalhador ao órgão previdenciário para os procedimentos de perícia, e suspenda a iniciativa rescisória, até as conclusões supervenientes do INSS. Consoante o item 7.4.4.3, alínea “e”, da Norma Regulamentadora no 7, aprovada pela Portaria nº 3.214, de 1978, o ASO que contiver a expressão “apto com restrições” equipara-se a “inapto”, por falta de previsão jurídica daquela condição atestada.
O que os Médicos dizem
Muitos médicos do trabalho defendem que o Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) deve conter apenas “apto” ou “inapto” justificando esse posicionamento na Portaria nº 24 de 29/12/94 do Ministério do Trabalho e da Secretaria de Segurança e Saúde no Trabalho, em sua NR 7 (PCMSO).
Por outro lado, outros profissionais defendem o posicionamento da ANAMT (Associação Nacional de Medicina do Trabalho) que sugere, conforme modelo 1 de ASO elencado na Sugestão de Conduta Médico Administrativa nº 6, 2001, as conclusões: “inapto”, “apto” e “apto com restrições”.
CONCEITO DO ASO "APTO COM RESTRIÇÃO"
O que a Empresa deve fazer na Teoria
Diante de um Atestado de Saúde Ocupacional (ASO) que atesta a aptidão de um trabalhador com restrições, a empresa assume a responsabilidade de implementar uma série de medidas que visam garantir a saúde, a segurança e os direitos do empregado.
Essas medidas abrangem desde a análise minuciosa das restrições especificadas no ASO até a adaptação do trabalho às limitações apresentadas, passando pela comunicação transparente com a equipe e o acompanhamento contínuo do trabalhador.
A reavaliação periódica das restrições e o fomento ao diálogo e à colaboração entre o trabalhador, a empresa e o médico do trabalho são igualmente fundamentais para assegurar um ambiente de trabalho inclusivo e respeitoso, no qual todos os trabalhadores se sintam valorizados e protegidos.
A implementação dessas medidas reflete o compromisso da empresa com a promoção da saúde e segurança no trabalho, bem como com o respeito aos direitos dos seus empregados.
O que o Trabalhador deve fazer na Teoria
Diante de um ASO com “Apto com Restrição”, o trabalhador deve, primeiramente, compreender as limitações impostas e seu impacto em suas atividades. É indispensável que comunique quaisquer dúvidas ou preocupações ao médico do trabalho e à empresa.
O estrito cumprimento das restrições, incluindo o uso de equipamentos de proteção, é mandatório. Por fim, deve informar à empresa qualquer desconforto ou dificuldade em seguir as restrições, garantindo um ambiente de trabalho seguro e adaptado às suas necessidades.
A PRÁTICA DO ASO "APTO COM RESTRIÇÃO"
Na prática o ASO “Apto com Restrição”, é usado amplamente nas empresas e gera inúmeras dificuldades tanto na “criação” de um posto de trabalho condizente com a restrição, quanto no controle dos documentos pela área de Recursos Humanos. Por outro lado, a área de Segurança do Trabalho fica sendo jogada de um lado para o outro para adequar o colaborador ao setor e risco.
Na verdade, a decisão do médico não deveria ser soberana como muitos pensam. A interpretação da legalidade do ASO “Apto com Restrição” deveria estar sobre a jurisdição da empresa. Afinal é ela que no final das contas, arcará com o processo de reintegração do colaborador demitido “com restrição”, com o processo civil por falta de ética na divulgação de uma patologia do colaborador ou um processo trabalhista pela exposição de colaborador com restrição a área de risco e até mesmo assédio moral pela exposição que ele terá dentro da empresa.
O ASO “Apto com Restrição” tem um caráter patriarcal, pois libera o colaborador de receber seus proventos do INSS e este passa a receber diretamente da empresa. Mas com que qualidade de trabalho, com que produtividade, qual o impacto disto na saúde física e psíquica do colaborador?
Quando levamos um colaborador com ASO “Apto com Restrição” para seu setor, encontramos duas situações antagônicas. A primeira é quando o profissional é da área administrativa e trabalha sentado, pode rever os colegas e sentir-se-á acolhido e a convivência pode até ajudar na recuperação.
Porém a maioria destes casos envolvem a operação e a manutenção e a medida do médico toma proporções bem ruins. É raríssimo um médico que conheça a fundo os processos produtivos a ponto de recomendar um posto onde o colaborador com restrição possa trabalhar e se recuperar, assim, fica a critério do gestor “encontrar” um local seguro para o colaborador.
Novamente a Segurança do Trabalho é chamada para verificar os riscos, sugerir melhorias e aprovar ou não o posto; trabalho este que deveria ser feito pelo médico do trabalho.
Muito embora o médico do trabalho esteja “amparado” pela ANAMT, o impacto deste hábito tem se mostrado um problema para colaboradores e empresa, atuando diretamente no clima organizacional, no passivo trabalhista, na produtividade e no aumento da exposição de colaboradores a riscos.
IMPLICAÇÕES DA CONDUTA E USO DO ASO “APTO COM RESTRIÇÃO”
Alocar um trabalhador com ASO “Apto com Restrição” em um posto que coloca em risco sua saúde e segurança, bem como ao setor que depende dessa mão de obra, acarreta uma série de impactos negativos que afetam tanto o indivíduo quanto a organização. Algumas situações a considerar:
- Impossibilidade de rescisão do contrato de trabalho por irregularidade junto ao MTE.
- Descumprimento do sigilo médico no caso da terceira via de o ASO ser enviado para outros departamentos como Produção, Manutenção e Recursos Humanos para ciência das “restrições”.
- Erro no enquadramento da função para dois funcionários distintos um que está apto e o outro com restrições.
- Problemas de relacionamento entre a área do profissional “Apto com Restrição” e a área médica.
- Necessidade de um sistema de monitoramento a ser implementado na área de saúde, no RH e o acompanhamento do trabalhador pelo líder do setor do colaborador.
- Transferência da responsabilidade da gestão da saúde do trabalhador para a liderança do setor.
- A falta de conhecimento das áreas pelo médico do trabalho pode vir a gerar risco de agravamento do quadro clínico do colaborador.
- Necessidade de avaliação do Gerenciamento de Mudança de Pessoas, envolvendo área do colaborador, o colaborador, Segurança e Saúde Ocupacional.
Para o Trabalhador
A exposição a riscos incompatíveis com suas restrições pode levar ao agravamento da condição de saúde do trabalhador, resultando em doenças ocupacionais, lesões ou sequelas permanentes. A incompatibilidade entre as restrições do trabalhador e as exigências do posto de trabalho aumenta o risco de acidentes de trabalho, que podem causar lesões graves, incapacidade temporária ou permanente e, em casos extremos, óbito.
A exposição a riscos e o agravamento da condição de saúde podem levar à redução da qualidade de vida do trabalhador, afetando seu bem-estar físico, mental e social. A alocação inadequada pode levar o trabalhador a se sentir discriminado, desvalorizado e inseguro no ambiente de trabalho, o que pode gerar danos morais e afetar sua autoestima e confiança.
O trabalhador pode ter dificuldades em desempenhar suas funções de forma eficiente, o que pode levar à redução da produtividade e à sobrecarga de outros colegas.
Para o Setor/Empresa
O trabalhador com ASO “Apto com Restrição” pode precisar se afastar do trabalho com frequência para realizar tratamentos médicos, o que aumenta o absenteísmo e prejudica a continuidade das atividades. A alocação inadequada do trabalhador pode levar à redução da produtividade do setor, seja pela dificuldade do trabalhador em desempenhar suas funções, seja pela necessidade de remanejar outros colegas para cobrir sua ausência.
A empresa pode ter que arcar com custos adicionais relacionados a tratamentos médicos, indenizações por acidentes de trabalho, afastamentos e substituições em função da alocação do trabalhador. A ocorrência de acidentes de trabalho ou o agravamento da condição de saúde do trabalhador podem prejudicar a imagem da empresa, afetando sua reputação e sua capacidade de atrair e reter talentos.
Processos trabalhistas em caso de acidentes de trabalho, doenças ocupacionais ou danos morais podem gerar custos elevados em caso de uma alocação não indicada. Além do risco de multas ou sanções por órgãos fiscalizadores em caso de descumprimento das normas de saúde e segurança no trabalho e impedimento da homologação no MTE.
O clima organizacional negativo, com desmotivação, insatisfação e conflitos entre os colegas é uma consequência inevitável de uma alocação inadequada de um trabalhador com aptidão restrita.
CONCLUSÃO
É fundamental que a empresa realize uma análise criteriosa das restrições do trabalhador e das exigências do posto de trabalho, a fim de garantir que a alocação seja adequada e que a saúde e a segurança do trabalhador sejam preservadas. A implementação de medidas preventivas, a adaptação do trabalho e o acompanhamento contínuo são essenciais para evitar os impactos negativos da alocação inadequada.